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Gastrectomia Vertical e Bypass Gástrico em Y de Roux. Existe diferença nos resultados a longo prazo?

por Anna Carolina Batista Dantas
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A Gastrectomia Vertical (GV) se tornou rapidamente a cirurgia bariátrica mais realizada no mundo. Entretanto, pouco se sabe sobre resultados a longo prazo quando comparados ao Bypass Gástrico em Y-de-Roux (BGYR).

Em agosto de 2022 foi publicado no JAMA Surgery um artigo com os resultados de 10 anos de seguimento do SLEEVEPASS, estudo randomizado comparativo entre GV e BGYR. Neste post iremos comentar os achados deste artigo.

Introdução

A Gastrectomia Vertical já representa mais de 60% dos procedimentos bariátricos realizados nos EUA e no mundo. Não se sabe ainda seus resultados em seguimento de longo prazo. Estudos recentes têm mostrado alta incidência de DRGE e até Esôfago de Barrett.

O trial SLEEVEPASS mostrou nos seguimentos de 5 e 7 anos resultados equivalentes para ambas as técnicas em termos de perda de peso, controle da diabetes, complicações e qualidade de vida.

Métodos

Estudo clínico randomizado prospectivo multicêntrico realizado na Finlândia de março de 2008 a junho de 2010 com 240 pacientes com IMC > 40 ou > 35  associado a comorbidades.  Em relação ao protocolo inicial, foi realizada um adendo para o estudo de 10 anos incluindo a realização de endoscopia digestiva alta.

O desfecho primário foi perda de peso através do cálculo da perda do excesso de peso (%EWL). Os desfechos secundários foram remissão das comorbidades, qualidade de vida, morbidade e mortalidade pós-operatória. Para essa análise de 10 anos houve um foco especial nos desfechos relacionados a refluxo, com sintomas, esofagite e esôfago de Barrett.

Resultados

Dos 238 pacientes inicialmente alocados no estudo, 193 completaram 10 anos de seguimento clínico e 176 o endoscópico. 

  • Perda de peso

A perda de peso através do %EWL foi de 43,5% para GV e 51,9% para BGYR. Apesar de diferença de 8,4% para BGYR, após imputar dados perdidos na análise, os resultados foram semelhantes. Em relação ao reganho de peso, foi 35% para GV e 24,7% para BGYR, sem significância estatística.

  • DRGE e Endoscopia

A prevalência de esofagite foi significativamente maior no sleeve do que no bypass, com 31% vs. 7%, respectivamente (p < 0,001). Paciente no grupo da GV também tinham significativamente mais uso de IBP (64% vs. 36%, p < 0,001), pior escore de qualidade de vida relacionada ao refluxo (10,5 vs. 0,0, p < 0,001) e mais sintomas de refluxo do que aqueles do grupo BGYR.

  • Remissão das comorbidades

A remissão da diabetes foi vista em 26% dos que fizeram sleeve e 33% do bypass, sem diferença estatística. Não houve também diferença nos valores da glicemia de jejum e hemoglobina glicada entre os grupos no seguimento de 10 anos.

A dislipidemia mostrou-se em remissão somente em 19% para GV e 35% para BGYR, sem significância estatística. Em relação a hipertensão arterial, somente 8% dos que fizeram GV estavam sem medicação no seguimento de 10 anos, enquanto 24% dos que fizeram BGYR (p = 0,04).

  • Qualidade de vida

Medida através do escore de Moorehead-Ardelt, a qualidade de vida em 10 anos melhorou significativamente para ambos os grupos em relação ao início do estudo. Não houve diferença entre as técnicas.

  • Morbimortalidade

Para análise dos 10 anos de estudos, todas as complicações ocorridas entre 30 dias e 10 anos foram avaliadas cumulativamente. A taxa de complicação grave (Clavien-Dindo >= IIIb) foi de 15,7% para GV e 18,5% para BGYR (p = 0,57). A maioria das reoperações de sleeve foi devido DRGE e as de bypass foram por hérnia interna. 

Discussão

Os resultados dessa análise comparativa de 10 anos entre Sleeve e Bypass mostram que ambas as técnicas resultaram em perda de peso importante e sustentada. Não houve diferença significativa na melhora das comorbidades, exceto HAS, cuja remissão foi superior no grupo do bypass. 

As trajetórias de perda de peso para GV e BGYR foram consistentes ao longo dos períodos de seguimento de 5, 7 e 10 anos. Quando analisado conjuntamente com outro grande trial (SM-BOSS), o bypass mostrou perda de peso superior através da perda do excesso de IMC, apesar de separadamente não haver essa diferença estatística nos trials. 

Uso de IBP, esofagite e sintomas de refluxo foram significativamente mais frequentes na GV em relação ao BGYR. Entretanto, Esôfago de Barrett foi igualmente incomum (4%) em ambos os grupos, comparados a resultados alarmantes publicados em outros estudos, que chegavam a 17% de Barrett após a Gastrectomia Vertical.

Isso é importante considerando a crescente prevalência de obesidade no mundo e a grande proporção de GV realizadas, o que poderia impactar em maior risco de Barrett e Adenocarcinoma de Esôfago no longo prazo. Outro estudo recente com 10,5 anos de seguimento mostrou incidência de 4% de Barrett. Essa discrepância nos resultados pode ser devido variabilidade nos critérios diagnósticos do Barrett, viés de seleção nos casos submetidos a endoscopia nos estudos menores ou até diferenças populacionais. 

Uma limitação importante desse estudo foi a falta de critérios para análise do refluxo no início do estudo, considerando sintomas, questionários e endoscopia somente no seguimento a longo prazo. 

Conclusões

Em 10 anos de seguimento, a perda do excesso de peso foi superior no Bypass em relação ao Sleeve. Não houve diferença estatística na remissão de comorbidades, exceto hipertensão. 

A incidência cumulativa de Esôfago de Barrett foi muito inferior ao reportado em outros estudos, mas sintomas de refluxo, uso de IBP e diagnostico de esofagite foram significativamente mais prevalentes após a Gastrectomia Vertical, reforçando a importância da avaliação da DRGE no pré-operatório para adequada seleção dos pacientes e escolha do procedimento.

Referência

Salminen P, Grönroos S, Helmiö M, Hurme S, Juuti A, Juusela R, Peromaa-Haavisto P, Leivonen M, Nuutila P, Ovaska J. Effect of Laparoscopic Sleeve Gastrectomy vs Roux-en-Y Gastric Bypass on Weight Loss, Comorbidities, and Reflux at 10 Years in Adult Patients With Obesity: The SLEEVEPASS Randomized Clinical Trial. JAMA Surg. 2022 Aug 1;157(8):656-666. doi: 10.1001/jamasurg.2022.2229. PMID: 35731535; PMCID: PMC9218929.

Como citar este artigo

Dantas ACB,. Gastrectomia Vertical e Bypass Gástrico em Y de Roux. Existe diferença nos resultados a longo prazo? Gastropedia; 2022. Disponível em: gastropedia.pub/pt/cirurgia/obesidade/gastrectomia-vertical-e-bypass-gastrico-em-y-de-roux-existe-diferenca-nos-resultados-a-longo-prazo

Anna Carolina Batista Dantas

Cirurgiã do Aparelho Digestivo pelo HC-FMUSP – RQE 95665
Certificada em área de atuação em Cirurgia Bariátrica – RQE 956641
Membro Titular CBC, CBCD e SCBCM


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