Os procinéticos são uma classe de fármacos utilizados no manejo de distúrbios da motilidade gastrointestinal. Seu mecanismo de ação baseia-se na estimulação das contrações do trato digestivo, favorecendo o esvaziamento gástrico e o trânsito intestinal. No Brasil, os principais representantes dessa classe incluem metoclopramida, domperidona, bromoprida, prucaloprida, neostigmina e eritromicina.
Este post resume o Expert Review da European Society of Neurogastroenterology and Motility em conjunto com The American Neurogastroenterology and Motility Society, que explora suas características farmacológicas, indicações clínicas e segurança.
1. Metoclopramida
A metoclopramida atua como antagonista dos receptores dopaminérgicos D2 e agonista parcial dos receptores serotoninérgicos 5-HT4, aumentando a liberação de acetilcolina no trato gastrointestinal. Esse mecanismo resulta no aumento da motilidade esofágica e gástrica.
Indicações:
- Gastroparesia diabética;
- Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE);
- Náuseas e vômitos associados a cirurgias ou quimioterapia.
Efeitos adversos: O uso prolongado da metoclopramida está associado a um risco aumentado de efeitos adversos neurológicos, incluindo discinesia tardia irreversível, parkinsonismo, acatisia e distonia aguda. Esses efeitos extrapiramidais ocorrem devido à sua capacidade de atravessar a barreira hematoencefálica e antagonizar os receptores dopaminérgicos centrais. Além disso, pode causar sedação e sintomas autonômicos, como hipotensão ortostática. Devido a esses riscos, recomenda-se que seu uso contínuo não ultrapasse 12 semanas, conforme diretrizes da FDA.
2. Domperidona
A domperidona é um antagonista D2 que, ao contrário da metoclopramida, não atravessa a barreira hematoencefálica, reduzindo os riscos de efeitos extrapiramidais.
Indicações:
- Dispepsia funcional;
- DRGE;
- Gastroparesia leve a moderada.
Efeitos adversos: A domperidona pode prolongar o intervalo QT e aumentar o risco de arritmias ventriculares, especialmente em pacientes idosos ou com doenças cardiovasculares preexistentes. O risco cardiovascular é dose-dependente e pode ser agravado pelo uso concomitante de outros fármacos que prolongam o intervalo QT, como alguns antibióticos macrolídeos e antidepressivos tricíclicos. Recomenda-se monitoramento cuidadoso em pacientes de alto risco.
3. Bromoprida
A bromoprida compartilha o mesmo mecanismo de ação da metoclopramida, sendo um antagonista D2 com propriedades serotoninérgicas moderadas.
Indicações:
- Náuseas e vômitos de diversas etiologias;
- Gastroparesia leve;
- DRGE.
Efeitos adversos: Entre os efeitos colaterais mais comuns estão sintomas extrapiramidais, sedação e fadiga, o que pode limitar seu uso crônico.
4. Prucaloprida
A prucaloprida é um agonista altamente seletivo dos receptores 5-HT4, estimulando a liberação de acetilcolina no trato gastrointestinal e promovendo um aumento na motilidade intestinal, com maior impacto na motilidade colônica.
Indicações:
- Constipação crônica idiopática resistente ao tratamento com laxantes.
Efeitos adversos: Pode causar cefaleia, diarreia e dor abdominal. Seu perfil de segurança cardiovascular é favorável, sem associação relevante com prolongamento do intervalo QT.
5. Neostigmina
A neostigmina é um inibidor da acetilcolinesterase, aumentando os níveis de acetilcolina na junção neuromuscular e promovendo contrações no trato gastrointestinal.
Indicações:
- Pseudo-obstrução colônica aguda (síndrome de Ogilvie);
- Distúrbios de motilidade intestinal pós-operatórios.
Efeitos adversos: Os efeitos colaterais incluem bradicardia, cólicas abdominais, sudorese excessiva e hipersalivação. O monitoramento cardíaco é recomendado durante sua administração.
6. Eritromicina
Além de sua função antibiótica, a eritromicina atua como um agonista dos receptores de motilina, estimulando contrações gástricas semelhantes às do complexo motor migratório.
Indicações:
- Gastroparesia grave, especialmente em pacientes diabéticos;
- Esvaziamento gástrico antes de procedimentos endoscópicos;
- Pseudo-obstrução intestinal.
Efeitos adversos: Seu uso prolongado pode induzir taquifilaxia, além de interferir na microbiota intestinal e aumentar o risco de resistência bacteriana. Também está associada a prolongamento do intervalo QT em alguns pacientes.
Doses recomendadas:
Metoclopramida: 10 mg via oral, intramuscular ou intravenosa, até 3 vezes ao dia (máximo de 30 mg/dia). Domperidona: 10 mg via oral, até 3 vezes ao dia (máximo de 30 mg/dia). Bromoprida: 10 mg via oral ou intramuscular, até 3 vezes ao dia (máximo de 30 mg/dia). Prucaloprida: 2 mg via oral, uma vez ao dia (1 mg para idosos ou pacientes com insuficiência renal grave). Neostigmina: 0,5–2 mg intravenoso, administrado lentamente (monitoramento cardíaco recomendado devido ao risco de bradicardia). Eritromicina: 250–500 mg via oral, a cada 8 horas; ou 3 mg/kg intravenoso a cada 8 horas em casos de gastroparesia severa. |

Figura 1: Procinéticos e seus mecanismos de ação.
Ref: Bor S, et al. Neurogastroenterol Motil. 2024.
Considerações Finais
Os procinéticos têm um papel fundamental no tratamento de distúrbios da motilidade gastrointestinal, mas seu uso deve ser individualizado conforme o perfil clínico do paciente. Enquanto a metoclopramida, domperidona e bromoprida são indicadas para gastroparesia e DRGE, a prucaloprida é uma opção mais segura para constipação crônica idiopática. A neostigmina e a eritromicina são reservadas para casos graves, como pseudo-obstrução intestinal e gastroparesia severa. A decisão terapêutica deve equilibrar eficácia e segurança, evitando o uso prolongado quando possível.
Referências
- Bor S, Kalkan İH, Savarino E, Rao S, Tack J, Pasricha J, Cangemi D, Schol J, Karunaratne T, Ghisa M, Ahuja NK, Lacy B. Prokinetics-safety and efficacy: The European Society of Neurogastroenterology and Motility/The American Neurogastroenterology and Motility Society expert review.
Neurogastroenterol Motil. 2024 May;36(5):e14774. doi: 10.1111/nmo.14774. Epub 2024 Mar 10. PMID: 38462678.
Como citar este artigo
Martins BC. Procinéticos: Mecanismo de Ação, Indicações e Segurança Gastropedia 2025; Vol 1. Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/gastroenterologia/procineticos-mecanismo-de-acao-indicacoes-e-seguranca/

Professor Livre-Docente pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Médico Endoscopista do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP)
Médico Endoscopista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz
Emerging Star pela WEO