Início » Megacolon Chagasico: Diagnóstico e Tratamento
Compartilhe:

Diagnóstico e Investigação

Testes sorológicos: na fase crônica da doença deve-se utilizar pelo menos dois métodos de princípios diferentes para a confirmação do diagnóstico, com sensibilidade de 100% e especificidade de 96,5%. São eles: hemoaglutinação indireta, imunofluorescência indireta e teste imunoenzimático.

Exame contrastado: Considera-se que o diâmetro do sigmóide distal maior que 6 cm caracteriza megacólon. No entanto, através do enema opaco, grupo brasileiro, fez estudo com proposta de uma classificação do diâmetro transverso do reto alto/sigmóide distal na altura das cristas póstero-superiores ou ao nível da quarta vértebra lombar. Dessa forma, subdividiu em:

  • Grau 0: pacientes sem MC: eixo transversal entre 2,0 e 5,0cm
  • Grau I: intersecção entre pessoas com e sem MC. Eixo entre 5,1 e 9,0cm
  • Grau II: eixo transverso entre 9,1 e 13,0cm
  • Grau III: eixo maior que 13,1cm

Manometria anorretal: exame reprodutível e examinador dependente com avaliação dos esfíncteres interno e externo do ânus, relaxamento do músculo puborretal, sensibilidade e capacidade do reto e, na suspeita de MC. A ausência reflexo inibitório retoanal (RIRA), significando comprometimento da inervação da transição anorretal e acalasia do esfíncter interno do ânus, embora seu papel nessa doença ainda permaneça controverso.

Nesse aspecto, grupo brasileiro avaliou a presença do RIRA em 39 portadores de MC e verificou sua ocorrência em 43,6% dos pacientes, entretanto com necessidade de maior insuflação do balão retal com uma média de 196 ml, ao passo que em pessoas sem MC a média de infusão foi de 18,8 ml. Assim, ao injetar 30 ml de ar a probabilidade de detectar o RIRA foi de 12,8%, com 60ml de 15,4% e com 250ml de 43,6%.

Colonoscopia: exame com objetivo fundamentalmente de rastreio de câncer colorretal, devendo sua indicação obedecer as diretrizes vigentes na literatura nacional e internacional quanto à idade e fatores de risco principalmente.

Tratamento

a) Clínico:

Inicia-se o tratamento do portador de MC sintomático para constipação intestinal com medidas clínica, como:

  • Estimular ingesta hídrica: exceção aos pacientes cardiopatas com restrição de líquidos;
  • Evitar dieta rica em fibras e formadores de bolo fecal pois aumentam a chance de impactação fecal;
  • Uso de medicamentos laxativos: lactulose, polietilenoglicol, picossulfato de sódio. Em situações de não evacuação por tempo mais prolongado pode-se utilizar o bisacodil e o uso de supositórios de glicerina a cada 3 a 5 dias
  • Fisioterapia do assoalho pélvico e biofeedback: para casos em que se associa dissinergia pélvica.
  • Lavagem intestinal: naquelas situações de não evacuação por longo tempo, mais de 5 dias com as medidas acima, orienta-se a realização de enteroclisma, sempre antecedido de toque retal para a avaliação de fecalomas. Essa, inclusive, é uma das principais indicações de cirurgia eletiva em portadores de MC, ou seja, a refratariedade aos laxantes por via oral e necessidade frequente de idas ao pronto-socorro ou pronto-atendimento para a realização de lavagens intestinais.

b) Cirúrgico:

As indicações de cirurgia são: refratariedade do tratamento clínico com necessidade frequente de lavagens intestinais e as complicações agudas, como o volvo de sigmóide principalmente. A cirurgia, quando bem indicada, proporciona importante alívio e melhora do principal sintoma do MC que é a constipação intestinal de tal forma, que a frequência dessa queixa é de 76% entre os pacientes não operados e de 39% entre os pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico (p<0,01). Além disso, estudos demonstram melhora significativa do escore de gravidade de constipação após a cirurgia.

Entretanto, é preciso ter em mente e, transparecer isso aos pacientes e familiares, que a cirurgia para o MC não cura a doença. Os principais objetivos são a melhora da constipação e a redução dos riscos de complicações, como o volvo de sigmoide e a impactação fecal com consequente formação de fecalomas.

Grande parte dos cirurgiões colorretais mais antigos tiveram seus relevantes aprendizados técnicos com a realização de procedimentos para o tratamento do MC, sendo que as principais abordagens para o tratamento dessa doença foram descritas por renomados profissionais do nosso país e as cirurgias possíveis compreendem uma infinidade de técnicas que envolvem diferentes extensões de ressecção do cólon, níveis e formas de anastomose, resultando em morbidade e recorrência pós-operatória variáveis. O racional do tratamento cirúrgico é ressecar toda a área de sigmóide dilatada (sigmoidectomia completa) e evitar a região da transição retossigmoideana para a realização das anastomoses, a fim de evitar a recidiva precoce dos sintomas.

Sendo assim, dentre as principais técnicas descritas historicamente, pode-se citar:

  • Técnica de Swenson e Soave: abaixamento de cólon transretal com ressecção de mucosa retal e telescopagem, descrita no final dos anos 1940.
  • Técnica de Duhamel-Haddad: abaixamento de cólon retro-retal posterior com exteriorização do coto e anastomose retardada, descrita entre os anos 1950 e 1960.
  • Técnica de Duhamel-Haddad modificada: abaixamento de cólon retro-retal posterior com tentativa de anastomose primária e utilização de pinças esmagadoras.
  • Técnica de Habr-Gama: nos anos 1990, após surgimento e aprimoramento dos grampeadores e suturas mecânicos foi proposta a retossigmoidectomia com ressecção do reto abaixo do promontório e subsequente anastomose primária na parede posterior do reto distal, término-lateral mecânica extraperitoneal com grampeador de 33 mm (acima do anel anorretal a cerca de 5-7cm da borda anal – Figura 3). O racional da técnica é exclusão boa parte do reto doente do trânsito intestinal, evitando assim a manipulação anterior, que teoricamente teria probabilidade de denervação autonômica e risco de lesão de órgãos e estruturas pélvicas, como a vagina, bexiga, próstata, vesículas seminais e uretra.

Figura 3: Anastomose término-lateral posterior mecânica.

Essa é a técnica mais utilizada atualmente, sendo ainda mais difundida com o advento da videolaparoscopia. Apresenta taxa média de recorrência de 15-20%, certamente relacionada ao tempo de seguimento, que quanto maior apresenta maiores taxas.

Referências

  1. Santos Júnior JCM. Megacólon – Parte II: Doença de Chagas. Rev Bras Coloproct, 2002(4):266-277
  2. Alves RMA, Thomaz RP, Almeida EA, Wanderley JS, Guariento ME. Chagas’ disease and ageing: the coexistence of other chronic diseases with Chagas’ disease in elderly patients. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. 2009; 42(6):622-8
  3. Nahas SC, Dias AR, Dainezi MA, Araújo SEA, Nahas CSR. A Vídeo-Cirurgia no Tratamento do Megacólon Chagásico. Rev bras Coloproct, 2006;26(4): 470-4
  4. Kamiji MM, Oliveira RB. O perfil dos portadores de doença de Chagas, com ênfase na forma digestiva, em hospital terciário de Ribeirão Preto, SP. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. 2005; 38(4):305-9
  5. Araújo SEA, Dumarco RB, Rawet V, Seid VE, Bocchini SF, Nahas SC. Depopulation of intersticial cells of Cajal in chagasic megacolon: towards tailored surgery? Arq Bras Cir Dig. 2010;32(2):81-5
  6. Silva AL, Giacomin RT, Quirino VA, Miranda ES. Proposta de classificação do megacólon chagásico através de enema opaco. Rev Col Bras Cir. 2003;30(1):4-10
  7. Cavenaghi S, Felicio OCS, Ronchi LS, Cunrath GS, Melo MMC, Netinho JG. Prevalence of rectoanal inhibitory reflex in chagasic megacolon. Arq Gastroenterol. 2008;45(2):128-31
  8. Nahas SC. Tratamento cirúrgico do megacólon chagásico pela retossigmoidectomia abdominal com anastomose mecânica colorretal término-lateral posterior imediata. Tese Professor Livre Docente, USP, São Paulo, 2000.
  9. Nahas SC, Pinto RA, Dias AR, Nahas CSR, Araújo SEA, Marques CFS, Cecconello I. Long-term follow up of abdominal rectosigmoidectomy with posterior end-to-side stapled anastomosis for Chagas megacolon. Olorectal Dis. 2011;13(3):317-22.

Como citar este artigo

Pinto RA, Neto IJFC, Camargo MGM, Nahas SC, Marques CFS. Megacolon Chagasico: Diagnóstico e Tratamento Gastropedia 2024, Vol.1 Disponível em: gastropedia.pub/pt/cirurgia/colorretal/megacolon-chagasico-diagnostico-e-tratamento/

Rodrigo Ambar Pinto

Professor livre-docente e Doutor pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Professor assistente da Disciplina de Coloproctologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo
Médico preceptor da residência médica de Cirurgia do Aparelho Digestivo e Coloproctologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Membro titular do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD) e da Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP)

Mariane Gouvea Monteiro de Camargo

Cirurgiã Colorretal pela Disciplina de Cirurgia do Aparelho Digestivo e Coloproctologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Médica do Departamento de Coloproctologia – Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Research Fellow (2017 – 2019) do Departamento de Cirurgia Colorretal da Cleveland Clinic, Cleveland – OH

Isaac José Felippe Corrêa Neto

Mestre e Doutor pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Carlos Frederico Sparapan Marques

Professor Livre-Docente, Doutor e Mestre pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Diretor do Serviço de Cirurgia do Cólon, Reto e Ânus do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Sérgio Carlos Nahas

Professor Titular do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, FMUSP-Área Coloproctologia. Professor Titular da Disciplina de Cirurgia do Aparelho Digestivo (2019-2022). Professor do Serviço de Cirurgia do Aparelho Digestivo e Coloproctologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – HC-FMUSP e de Cirurgia Oncológica do Câncer do Cólon, Reto e do Ânus, do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Otávio Frias de Oliveira – ICESP HC-FMUSP Pós Graduado em Coloproctologia no St. Marks Hospital and Academic Institute of London (1990), Livre Docência na Disciplina de Coloproctologia pela FMUSP (2000).


Compartilhe:

Artigos relacionados

Deixe seu comentário

AVISO

Site exclusivo para profissionais da área médica e da saúde.

 

As informações aqui fornecidas são opiniões dos autores e não devem ser utilizadas como única fonte de referência.

 

Os editores deste site não se responsabilizam pelo eventual uso inadequado do conhecimento por pessoas inabilitadas. 

RECEBA NOSSA NEWSLETTER

Cadastre-se e receba regularmente nossas novidades!

PARA PACIENTES

Gastropedia © 2022 – Todos os direitos reservados. – Desenvolvido por MINDAGE