Nódulo hepático detectado pela ultrassonografia: passo a passo de quando e como investigar
Ao nos depararmos com uma ultrassonografia (USG) descrevendo uma lesão focal hepática, devemos organizar o raciocínio de quando e como investigar a lesão descrita: trata-se de lesão focal cística, com paredes regulares, conteúdo anecoico e sem sinais de complexidade (septos, calcificações, margens irregulares)?
Se sim e o exame feito por radiologista experiente, não é necessária investigação adicional. Entretanto, se houver lesão focal cística complexa ou lesão focal sólida, estas possuem indicação de investigação com exame de imagem contrastado (tomografia computadorizada ou ressonância magnética de abdome superior).
Figura 1. Ultrassonografia de abdome evidenciando nódulo sólido, hiperecogênico, medindo aproximadamente 1,0 cm, circunscrito, localizado no lobo direito, segmento hepático VII. Fonte: arquivo pessoal.
É fundamental pedir o exame corretamente, isto é, descrever no pedido do exame que é direcionado à investigação de lesão focal hepática. Isso será fundamental para se alinhar o protocolo correto no dia do exame, em especial, de tomografia de abdome com contraste endovenoso (iodo) com protocolo trifásico – além da fase pré-contraste, haverá as fases arterial, portal e equilíbrio.
O exame de ressonância de abdome com contraste endovenoso (gadolíneo) realiza as fases contrastadas (arterial, portal, equilíbrio) habitualmente, além de possuir sequências adicionais que auxiliam na avaliação da lesão focal (sequências T1 pré-contraste; in-phase e out-of-phase para avaliação de gordura; T2 e difusão).
Recomenda-se fortemente que se mencione no pedido do exame os dados clínicos mais significativos do paciente, como idade, sintomas, ausência/presença de doença hepática crônica e/ou cirrose hepática, uso de anabolizantes ou anticoncepcionais e doença oncológica prévia ou atual.
Nota 1: A presença de cirrose hepática é o dado clínico mais relevante e o fator de risco mais significativo para o desenvolvimento de carcinoma hepatocelular (CHC), de forma que a cirrose está presente em aproximadamente 90% dos pacientes com CHC. Logo, um nódulo hepático em fígado cirrótico, a principal suspeita será de CHC; já um nódulo hepático em fígado não-cirrótico, haverá maior chance de lesão focal benigna.
Dentre as lesões focais hepáticas benignas, destacam-se: hemangioma, hiperplasia nodular focal e adenoma. Tais lesões apresentam diferentes padrões de ecogenicidade a USG, podendo ser hiperecogênicos, isoecogênicos ou hipoecogênicos e suas particularidades serão temas de próximos posts
Um diagnóstico diferencial a ser lembrado é a possibilidade de área poupada de esteatose, quando o fígado como um todo se torna hiperecogênico pela deposição de gordura e uma área específica é poupada desta, gerando a falsa impressão de lesão focal nodular hipoecogênica. Há ainda casos de esteatose focal, quando o depósito de gordura ocorre de forma localizada, simulando um nódulo hiperecogênico.
Nota 2: Excetuando-se os cistos hepáticos simples, as lesões focais hepáticas sólidas merecem investigação dinâmica com exame contrastado endovenoso para a avaliação do seu comportamento nas diferentes fases de enchimento e esvaziamento vascular, mesmo que sejam sugestivos de lesão benigna à ultrassonografia de abdome.
Na maioria das vezes, a identificação de lesão focal hepática benigna será incidental, em exames de rotina, sem repercussão clínica (sintomas ou complicações) e sem alterações laboratoriais. Após o exame contrastado inicial (TC/RM), casos selecionados serão candidatos à ressonância de abdome com contraste hepatoespecífico (ácido gadoxético – Primovist), biópsia do nódulo hepático ou até encaminhados para abordagem cirúrgica.
Desta forma, os médicos de diferentes especialidades devem ter o discernimento de investigar de forma adequada o achado de nódulo hepático em exame de rotina ou optar por encaminhar o paciente para avaliação especializada com gastro-hepatologista.
Saiba mais sobre avaliação das lesões hepáticas nesse outro artigo
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Como citar esse artigo
Oti, KST. Nódulo hepático detectado pela ultrassonografia: passo a passo de quando e como investigar. Gastropedia 2022. Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/gastroenterologia/figado/nodulo-hepatico-detectado-pela-ultrassonografia-passo-a-passo-de-quando-e-como-investigar/
Referências
- Haring MPD, Cuperus FJC, Duiker EW, de Haas RJ, de Meijer VE. Scoping review of clinical practice guidelines on the management of benign liver tumours. BMJ Open Gastroenterol. 2021 Aug;8(1):e000592. doi: 10.1136/bmjgast-2020-000592. PMID: 34362758; PMCID: PMC8351490.
- Strauss E, Ferreira AdeSP, França AVC, et al. Diagnosis and treatment of benign liver nodules: Brazilian Society of hepatology (SBH) recommendations. Arq Gastroenterol 2015;52:47–54.
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