Otimização dos resultados após cirurgias bariátricas e metabólicas

A obesidade e suas complicações estão se tornando cada vez mais prevalentes em todo o mundo. Diante desse cenário desafiador, é fundamental adotar abordagens multifacetadas e eficazes para prevenir e tratar essa condição de saúde pública. O crescente reconhecimento da obesidade como uma doença crônica e progressiva tem impulsionado avanços significativos no campo do tratamento.

Novos medicamentos antiobesidade têm demonstrado promissora eficácia no combate ao excesso de peso. No entanto, a personalização do tratamento é essencial, combinando diferentes estratégias para garantir que todos tenham acesso equitativo a opções terapêuticas eficazes.

Atualmente, a cirurgia bariátrica/metabólica é considerada a intervenção mais eficaz e duradoura para o tratamento da obesidade e suas complicações. Acredita-se que, quando bem indicado, o uso concomitante de medicamentos antiobesidade antes, durante ou após a cirurgia possa potencializar os resultados, otimizando desfechos em casos selecionados. No entanto, ainda há lacunas significativas de evidências científicas sólidas para orientar essas recomendações.

Opções para o tratamento farmacológico da obesidade disponíveis no Brasil:

  • Sibutramina
  • Orlistat
  • Liraglutida (Saxenda)
  • Semaglutida (Ozempic/Wegovy)
  • Associação de Bupropiona com Naltrexona (Contrave)

Uso de medicamentos antiobesidade antes da cirurgia bariátrica/metabólica

A perda de peso antes da cirurgia pode melhorar os resultados durante e após o procedimento, mas seu impacto nas complicações pós-operatórias é limitado, especialmente com o uso de técnicas laparoscópicas por equipes experientes. A gestão de peso pré-operatória deveria se centrar mais na educação e modificações de comportamento do que na própria perda de peso.

Para quem se poderia considerar o uso de medicamentos antiobesidade no pré-operatório com o intuito de otimizar resultados cirúrgicos?

  • Pessoas com obesidade grave e índice de massa corporal acima de 50 Kg/m2
  • Pacientes com diabetes mellitus do tipo 2 para melhora do controle glicêmico

Pacientes com cirrose hepática, insuficiência cardíaca ou renal se beneficiariam da perda de peso pré-operatória, porém não existem estudos com medicações para perda de peso nessas populações.

A escolha da farmacoterapia deve ser individualizada dentro do que dispomos de opções. Estudos mostram que enquanto Orlistat apresenta uma perda discreta e pouco auxílio na perda pré-operatória, os medicamentos análogos de GLP-1 mostram grande eficácia em relação à perda de peso e controle glicêmico.

Recomendações para Suspensão de Medicamentos Antiobesidade no Pré-Operatório

Os medicamentos antiobesidade, especialmente os análogos do peptídeo semelhante ao glucagon -1 (GLP-1), são amplamente reconhecidos por sua eficácia na perda de peso e controle metabólico. No entanto, devido ao seu efeito de lentificar o esvaziamento gástrico, é importante considerar sua suspensão antes de procedimentos cirúrgicos.

De acordo com a Sociedade Americana de Anestesiologia, para os análogos de GLP-1 de uso diário, como a liraglutida, recomenda-se a manutenção do uso até o dia anterior à cirurgia. Por outro lado, para os análogos de GLP-1 de uso semanal, como a semaglutida, o uso deve ser interrompido até 7 dias antes do procedimento.

No Brasil, a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) oferece diretrizes que recomendam interromper o uso da liraglutida 2 dias antes da cirurgia e da semaglutida (oral ou subcutânea) 21 dias antes. Para a dulaglutida, a recomendação é suspender 15 dias antes. Essas orientações baseiam-se na meia-vida dos medicamentos e na prática de suspender o uso com 3 meias-vidas de antecedência, embora haja escassez de estudos específicos.

A Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA) concorda com as orientações da SBD.

Uso de medicamentos antiobesidade após a cirurgia bariátrica/metabólica

Para pacientes enfrentando perda de peso subótima ou reganho excessivo após a cirurgia, as opções de tratamento são limitadas. Reparos pós-cirúrgicos, conversões para procedimentos mais invasivos ou reintrodução de técnicas de manejo do estilo de vida são algumas alternativas. No entanto, tais procedimentos adicionais apresentam taxas de complicações mais elevadas. Nesse cenário, a farmacoterapia surge como uma alternativa potencialmente mais segura.

Atualmente, não há medicamentos aprovados especificamente para pacientes pós-cirurgia bariátrica com perda de peso insuficiente ou reganho de peso. Essa população é frequentemente excluída de grandes estudos. No entanto, evidências mostram que o uso off-label de medicamentos antiobesidade pode resultar em uma perda de peso significativa. Por exemplo, pacientes que receberam liraglutida 3.0 mg após a cirurgia apresentaram reduções notáveis no peso, sugerindo sua eficácia nesse contexto.

É importante considerar que diferentes tipos de cirurgia bariátrica podem influenciar a resposta ao tratamento medicamentoso. Enquanto algumas cirurgias aumentam os níveis de peptídeo semelhante ao glucagon-1 (GLP-1) e contribuem para a perda de peso, outras podem ter efeitos diferentes. Estudos mostraram que pacientes submetidos a gastrectomia vertical podem perder menos peso em comparação com outros procedimentos.

Por que e quando considerar estratégias combinadas?

Por que?:

  • A probabilidade de recidiva do T2D após um período de remissão, associada a uma resposta de peso subótima e ganho de peso recorrente.
  • A perda de peso total de mais de 15% após cirurgia bariátrica sustentada pode controlar ou interromper complicações do diabetes e reduzir a mortalidade.
  • A progressão da doença crônica (obesidade e/ou diabetes mellitus tipo 2) pode exigir tratamentos mais intensivos, incluindo o uso adicional de medicamentos para manter ou melhorar o controle metabólico após a cirurgia.

Quando?:

  • Recidiva do diabetes tipo 2 ou descontrole após cirurgia e/ou resposta subótima da perda de peso.
  • Pacientes com índice de massa corporal inicial elevado, especialmente acima de 50 kg/m2, podem precisar iniciar o uso de medicamentos mais precocemente para evitar o reganho de peso.

Apesar do crescente interesse, há escassez de dados de ensaios clínicos randomizados (RCTs) sobre a combinação de fármacos antiobesidade e cirurgia bariátrica/metabólica.

Dentre os estudos clínicos relevantes:

  • No estudo STAMPEDE, que comparou terapia médica intensiva isolada com cirurgia mais tratamento médico, pacientes submetidos à cirurgia, além do melhor tratamento médico, alcançaram uma perda de peso mais significativa após um acompanhamento de 5 anos, destacando a eficácia da combinação de medicamentos com cirurgia.

O estudo Microvascular Outcomes after Metabolic Surgery, um ensaio clínico randomizado que compara a melhor terapia clínica com a cirurgia de bypass gástrico em Y-de-Roux (RYGB) em pacientes com diabetes tipo 2 (T2D) e microalbuminúria estabelecida, tem como objetivo examinar a remissão da albuminúria, a perda de peso, o controle glicêmico, entre outros desfechos secundários.

Quanto à escolha de medicamentos, a terapia com agonistas do receptor de GLP1 demonstrou eficácia e segurança, conforme evidenciado pelo estudo GRAVITAS, que destacou melhorias no controle glicêmico e perda de peso em pacientes com diabetes tipo 2 após cirurgia bariátrica.

Referências:

  1. Nor Hanipah Z, Nasr EC, Bucak E, Schauer PR, Aminian A, Brethauer SA, et al. Efficacy of adjuvant weight loss medication after bariatric surgery. Surgery for Obesity and Related Diseases. 2018 Jan;14(1):93–8. Miras AD, Pérez-Pevida B, Aldhwayan M, Kamocka A,
  2. McGlone ER, Al-Najim W, et al. Adjunctive liraglutide treatment in patients with persistent or recurrent type 2 diabetes after metabolic surgery (GRAVITAS): a randomised, double-blind, placebo-controlled trial. The Lancet Diabetes & Endocrinology. 2019 Jul;7(7):549–59.
  3. Tewksbury C, Williams NN, Dumon KR, Sarwer DB. Preoperative Medical Weight Management in Bariatric Surgery: a Review and Reconsideration. OBES SURG. 2017 Jan;27(1):208–14.
  4. Malone M, Alger-Mayer SA, Lindstrom J. Use of Orlistat 60 mg in the Management of Weight Loss before Bariatric Surgery. Ann Pharmacother. 2012 Jun;46(6):779–84.
  5. Cohen RV, Pereira TV, Aboud CM, Petry TBZ, Lopes Correa JL, Schiavon CA, et al. Effect of Gastric Bypass vs Best Medical Treatment on Early-Stage Chronic Kidney Disease in Patients With Type 2 Diabetes and Obesity: A Randomized Clinical Trial. JAMA Surg. 2020 Aug 19;155(8):e200420.
  6. Mok J, Adeleke MO, Brown A, Magee CG, Firman C, Makahamadze C, et al. Safety and Efficacy of Liraglutide, 3.0 mg, Once Daily vs Placebo in Patients With Poor Weight Loss Following Metabolic Surgery: The BARI-OPTIMISE Randomized Clinical Trial. JAMA Surg [Internet]. 2023 Jul 26 [cited 2023 Aug 6]; Available from: https://jamanetwork.com/journals/jamasurgery/fullarticle/2807724

Como citar este artigo

Cohen RV, Silva LP. Otimização dos resultados após cirurgias bariátricas e metabólicas Gastropedia 2024, Vol 2. Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/cirurgia/otimizacao-dos-resultados-apos-cirurgias-bariatricas-e-metabolicas




Mecanismos de ação das cirurgias bariátrica e metabólicas: Muito além de restrição e má absorção

A obesidade é uma doença crônica e é considerada uma epidemia global sendo associada a uma série de complicações, tais como diabetes tipo 2, hipertensão, dislipidemia e doenças cardiovasculares. A cirurgia bariátrica/metabólica é eficaz no tratamento da obesidade e na melhora ou resolução de diversas complicações associadas.

No Brasil as cirurgias bariátricas/metabólicas mais realizadas são Bypass gástrico em Y de Roux e Gastrectomia vertical. Muitos ainda acreditam que as cirurgias funcionam apenas por meio de restrição alimentar e disabsorção. No entanto, as intervenções cirúrgicas ocasionam diversas mudanças fisiológicas que contribuem para seus mecanismos de ação. Restrição e má absorção são complicações das cirurgias bariátricas e metabólicas.

Impacto da Cirurgia Bariátrica/metabólica nas Alterações Hormonais:

  • Insulina e Hormônios Incretínicos: Pacientes submetidos à cirurgia bariátrica/metabólica frequentemente apresentam melhora na sensibilidade à insulina e na secreção de hormônios incretínicos, como o peptídeo semelhante ao glucagon 1 (GLP-1) e o peptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP). Essas alterações contribuem para o controle glicêmico e a remissão do diabetes tipo 2, além de promover menos fome e saciedade.
  • Leptina e Grelina: A cirurgia bariátrica/metabólica pode resultar em redução da leptina, hormônio produzido pelo tecido adiposo que regula a saciedade, e diminuição dos níveis de grelina, hormônio orexígeno sintetizado no estômago. Essas mudanças hormonais auxiliam na regulação do apetite e na manutenção da perda de peso pós-cirurgia. Porém, não há evidência de que esses efeitos tenham interferência nos resultados a longo prazo, principalmente em relação à perda ponderal.
  • Peptídeo YY (PYY) e a oxintomodulina (OXM): Estes hormônios estão envolvidos na regulação do apetite e da saciedade, também podem ser influenciados pela cirurgia bariátrica/metabólica promovendo uma resposta metabólica favorável e ajudando na manutenção da perda de peso a longo prazo
  • Modificação da Microbiota Intestinal : A cirurgia bariátrica/metabólica pode alterar a composição e a função da microbiota intestinal, que desempenha um papel importante na regulação do peso corporal e do metabolismo. Essas alterações podem contribuir para a melhoria do controle glicêmico e do metabolismo lipídico. As modificações da flora bacteriana têm relação direta com aumento de circulação de ácidos biliares secundários que tem dentre suas ações fisiológicas a diminuição da fome, aumento da saciedade e melhora de secreção insulínica incretino-independente, isto é, sua secreção independe de ingesta alimentar para ocorrer.
  • Melhora da Sensibilidade à Insulina: Muitos portadores de obesidade também apresentam resistência à insulina, um fator de risco para o desenvolvimento de diabetes tipo 2. A perda de peso induzida pela cirurgia bariátrica/metabólica melhora a sensibilidade à insulina e, em alguns casos, levar à remissão do diabetes tipo 2.
  • Redução da Inflamação Crônica: A obesidade está frequentemente associada a um estado de inflamação crônica de baixo grau, que contribui para o desenvolvimento de doenças metabólicas, cardiovasculares e outras condições crônicas. A perda de peso após a cirurgia bariátrica/metabólica pode reduzir a inflamação e melhorar a saúde geral do paciente

As alterações hormonais desencadeadas pela cirurgia bariátrica/metabólica desempenham um papel fundamental nos efeitos metabólicos e fisiológicos observados após o procedimento. Compreender essas mudanças hormonais é essencial para melhorar as estratégias terapêuticas e otimizar os resultados clínicos em pacientes submetidos à cirurgia bariátrica/metabólica.

Leia também

Referências:

  1. Laferrere B. Diabetes remission after bariatric surgery: is it just the incretins? Int J Obes. 2011;35 Suppl 3:S22–5.
  2. UK Prospective Diabetes Study (UKPDS) Group. Intensive blood-glucose control with sulphonylureas or insulin compared with conventional treatment and risk of complications in patients with type 2 diabetes (UKPDS 33). Lancet 1998;352:837–853
  3. Cohen RV, Pinheiro JC, Schiavon CA, Salles JE, Wajchenberg BL, Cummings DE. Effects of gastric bypass surgery in patients with type 2 diabetes and only mild obesity. Diabetes Care 2012;35:1420-8. DOI: http://dx.doi.org/10.2337/dc11-2289
  4. Hansen EN, Tamboli RA, Isbell JM, et al. Role of the foregut in the early improvement in glucose tolerance and insulin sensitivity following Roux-en-Y gastric bypass surgery. Am J Physiol Gastrointest Liver Physiol. 2011;300(5):G795–802.
  5. Cohen RV, Rubino F, Schiavon C, Cummings DE. Diabetes remission without weight loss after duodenal bypass surgery. Surg Obes Relat Dis 2012;8:e66–e68

Como citar este artigo

Pechy F, Cohen R. Mecanismos de ação das cirurgias bariátrica e metabólicas: Muito além de restrição e má absorção Gastropedia 2024; vol 2. Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/cirurgia/mecanismos-de-acao-das-cirurgias-bariatrica-e-metabolicas-muito-alem-de-restricao-e-ma-absorcao




Como identificar quem terá a melhor resposta à cirurgia bariátrica e metabólica

Introdução

Sendo doenças crônicas e progressivas e de fundamentos biológicos semelhantes, a perda de peso e o controle do diabetes mellitus do tipo 2 após cirurgia bariátrica e metabólica apresentam uma grande variabilidade. Habitualmente, se espera uma perda de peso maior e um melhor controle do diabetes com diferentes intervenções cirúrgicas, como gastrectomia vertical (“sleeve”), gastroplastia em Y de Roux (“bypass”) e derivações bílio-pancreáticas (Scopinaro e switch duodenal). No entanto, características individuais e das próprias doenças, obesidade e diabetes, podem ter uma influência ainda maior na resposta desses pacientes à cirurgia. Nesse artigo, vamos discorrer sobre os preditores de resposta à cirurgia bariátrica e metabólica.

Perda de peso

A perda de peso após todos os tipos de cirurgia bariátrica/metabólica segue um padrão de distribuição normal, conhecido como curva de Gauss, com pacientes apresentando resposta sub ótima ou excelente nos extremos de distribuição e com a maioria dos pacientes apresentando uma perda de peso na região central da curva. Essa região central da curva corresponde a uma perda de peso entre 20 a 35% do peso inicial (antes da cirurgia).

Em um estudo1 foi observado essa variabilidade e que a perda de peso dos 3 aos 6 meses após a gastrectomia vertical e/ou gastroplastia em Y de Roux foi o fator determinante mais importante na perda de peso total. Oitenta por cento dos pacientes que perderam menos de 500 gramas por semana nesse período não obtiveram uma perda de peso maior do que 20% do peso inicial o que caracterizava resposta clínica sub ótima ao tratamento. Não houve influência da idade, sexo, raça, índice de massa corporal (IMC) inicial, presença de diabetes do tipo 2 ou hospital de realização da cirurgia nessa perda de peso.

Em outro estudo2, foi realizado avaliação do genótipo de 848 pacientes com obesidade submetidos a gastroplastia em Y de Roux. Foram identificados 13 pares de parentes de primeiro grau, 10 pares de indivíduos sem relação genotípica, mas morando na mesma residência e o restante foi pareado de maneira aleatória (794 pacientes). A perda de peso dos pares de parentes de primeiro grau foi bastante similar e isso não foi observado nos outros pares estudados. Portanto, fatores genéticos exerceram uma forte influência na perda esperada de peso.

Controle de diabetes mellitus do tipo 2

Como na obesidade, a resposta dos pacientes com diabetes ao tratamento cirúrgico também apresenta variabilidade, com pacientes com respostas adequadas e outros com menor intensidade no controle da doença. De maneira geral, espera-se um alto grau de controle do diabetes após a cirurgia.

Duas escalas, DiaRem3 e DiaRem24, foram propostas para a identificação de pacientes com maior e menor probabilidade de controle do diabetes após a cirurgia bariátrica/metabólica. Nessas escalas, são avaliados a idade do paciente, o nível da HbA1c (%) no pré-operatório, tempo de duração do diabetes, uso de drogas para tratamento do diabetes e o uso de insulina. Pacientes com pontuações mais baixas em cada item apresentavam uma maior probabilidade de controle da doença após a gastroplastia em Y de Roux e gastrectomia vertical (tabela 1). Vale ressaltar que o IMC antes da cirurgia não foi um fator determinante na resposta do diabetes.

% remissão total ou parcial

Pontuação
88 0 – 2
64 3- 7
23 8 – 12
6 – 16 13 – 17
2 18 – 22
Tabela 1 – Porcentagem de remissão de acordo com pontuação na escala DiaRem

Pacientes com um subgrupo específico de diabetes, SIRD (severe insulin resistance diabetes ou diabetes com resistência grave à insulina) apresentam uma maior probabilidade de complicações renais, macrovasculares e coronárias5. No entanto, esse subgrupo apresenta uma probabilidade maior de remissão glicêmica e maior redução de estágio de doença renal do que outros grupos de pacientes com diabetes após o tratamento cirúrgico.

Atualmente, é importante salientar o papel da perda de peso pós-operatória no controle do diabetes, lembrando que as duas doenças têm diversos mecanismos fisiopatológicos comuns6. Pacientes com maior perda de peso, além dos benefícios de melhora de risco cardiovascular e de qualidade de vida, apresentam uma maior probabilidade de controle adequado do diabetes a longo prazo.

Conclusão

De maneira geral, pacientes com obesidade e diabetes com idade até 60 anos, com menor tempo de doença diabetes, com menor glicotoxicidade, menor tempo de uso de insulina, do subgrupo SIRD e com maior perda de peso no pós-operatório provavelmente apresentarão uma melhor resposta ao tratamento cirúrgico. Mas, pacientes com características não ideais também podem e devem receber avaliação individualizada para o tratamento cirúrgico.

Referências

  1. Manning S, Pucci A, Carter NC et al. Early postoperative weight loss predicts maximal weight loss after sleeve gastrectomy and Roux-en-Y gastric bypass. Surg Endosc 2015:29;1484-91
  2. Hatoum IJ, Greenwalt DM, Cotsapas C et al. Heritability of weight loss response to gastric bypass surgery. The Journal Clin Endo Met 2011:96;1630-33
  3. Wood CG, Horwitz D, Still CD et al. Perfomance of DiaRem score for predicting diabetes remission in two health systems following bariatric surgery procedures in Hispanic and non-Hispanic white patients. Obes Surg 2018:28;61-68
  4. Still CD, Benotti P, Mirshahi et al. DiaRem2: incorporating duration of diabetes to improve prediction of diabetes remission after metabolic surgery. Surg Obes Relat Dis 2019:15;717-24
  5. Raverdy V, Cohen RV, Caiazzo R et al. Data-driven subgroups of type 2 diabetes, metabolic response, and renal risk profile after bariatric surgery: a retrospective cohort study. Lancet Diabetes Endocrinol 2022:10;167-76
  6. Linvay I, Sumithran P, Cohen RV et al. Obesity management as a primary treatment goal for type 2 diabetes: time to reframe the conversation. Lancet 2022:399;394-405

Leia também:

Como citar este artigo

Pinheiro-Filho JC e Cohen RV. Como identificar quem terá a melhor resposta à cirurgia bariátrica e metabólica Gastropedia 2024, Vol 1. Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/cirurgia/como-identificar-quem-tera-a-melhor-resposta-a-cirurgia-bariatrica-e-metabolica




Novas medicações para obesidade

Durante muitos anos a disponibilidade limitada de opções medicamentosas eficazes comprometeu o tratamento da obesidade. Sabemos que a mudança do estilo de vida com melhores escolhas nutricionais, inclusão de atividade física, terapias comportamentais são importantes para prevenção da obesidade e também fazem parte do tratamento.

É de suma importância entender que uma vez diagnosticada a obesidade, é necessário implementar medidas farmacológicas e em determinados casos medidas cirúrgicas para o tratamento adequado do paciente. Observa-se atualmente uma inércia em iniciar o tratamento medicamentoso.

Por muitos anos tivemos poucas opções medicamentosas para o tratamento da obesidade e muitas delas com registros de segurança insatisfatórios. Porém na última década, principalmente nos últimos 5 anos, estão sendo desenvolvidas novas medicações que proporcionam resultados importantes de perda de peso, associado a melhora significativa do controle metabólico, cardiovascular e renal.

O tratamento medicamentoso deve ser individualizado e para isso precisamos avaliar as contra indicações, tolerância, segurança e eficácia além do mecanismo de ação da droga versus o fenótipo de cada paciente.

Atualmente as medicações aprovadas pela Anvisa para obesidade são:

Orlistate e Sibutramina são as medicações mais antigas em uso no Brasil.

  • ORLISTATE:

    • Perda de peso discreta e redução de 45% de evolução para o Diabetes Mellitus tipo 2 ( DM2), em pacientes com intolerância à glicose.

  • SIBUTRAMINA:

    • Perda ponderal em torno de 4%;
    • Contra indicações: doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca congestiva, arritmia ou acidente vascular cerebral

  • NALTREXONA + BUPROPIONA (CONTRAVE)

    • Liberada pela Anvisa em 2023.
    • Bupropiona, um inibidor da reabsorção de dopamina e a naltrexona, um agonista do receptor de opioide, funcionam de forma sinérgica, diminuindo a ingestão de alimentos e do peso corporal.
    • Ensaios clínicos: COR-I, COR-II, COR-BMOD E COR-Diabetes revelam que a combinação de bupropiona e naltrexona pode ser eficaz para uma perda de peso entre de 5,0% a 9,3% em comparação ao grupo placebo a depender do estudo analisado.

Os agonistas do receptor de GLP-1 (GLP-1 RA), representados pelo Saxenda (Liraglutida 3,0 mg) e Wegovy (Semaglutida 2,4mg), têm um bom perfil de segurança e tolerabilidade, proporcionando um tratamento eficaz para redução do peso e controle glicêmico, além disso vários estudos demonstraram outros benefícios como redução do risco de eventos cardiovasculares adversos maiores (MACE) em pessoas com e sem DM2 e mais recentemente também proteção renal.

A Liraglutida foi aprovada pela Anvisa para tratamento da obesidade há anos atrás, já a Semaglutida foi aprovada em 2023.

  • LIRAGLUTIDA

    • Agonista do receptor de GLP-1 tem 97% de homologia ao GLP-1 humano.
    • Meia vida de aproximadamente 13h; administração diária.
    • Entre várias ações, estimula a liberação de insulina, dependente da glicose, pelo pâncreas e retarda o esvaziamento gástrico.
    • Efeitos colaterais mais comuns são gastrointestinais, entre eles náuseas e vômitos.
    • Estudo SCALE estudou Saxenda para o controle de peso em pessoas sem DM2 e com DM2, os quais 63,2% dos pacientes perderam mais de 5% de peso e 33,1% perderam mais de 10%.

  • SEMAGLUTIDA

    • Agonista do receptor de GLP-1 de segunda geração tem 94% de homologia ao GLP-1humano.
    • Meia vida de aproximadamente uma semana; administração semanal, melhorando a aderência do paciente e a qualidade de vida.
    • Estudo STEP: oito ensaios clínicos principais com 2,4 mg de semaglutida evidenciando uma perda média de aproximadamente 15% do peso corporal em 47% dos pacientes do grupo de semaglutida comparado a apenas 4,8% do grupo placebo. Uma redução de 5% ou mais do peso ocorreu em 86,4% dos indivíduos no grupo da semaglutida.
    • Estudo SELECT: redução de 20% de eventos cardiovasculares adversos graves em pacientes sem DM2 em uso de 2,4mg de semaglutida. Esse benefício já havia sido avaliado no estudo Leader com liraglutida, porém apenas em pacientes com DM2.
    • Estudo FLOW: redução de 24% na progressão da doença renal, bem como na morte cardiovascular e renal para pessoas tratadas com semaglutida 1,0 mg em comparação com o placebo em pessoas com DM2 e DRC

Além das novas medicações, Contrave e Wegovy aprovadas em 2023 pela ANVISA; mais recentemente a Tirzepatida que já foi aprovada pela ANVISA para uso em DM2, cujo nome comercial é Mounjaro, foi também aprovada pelo FDA (Food and Drug Administration) para obesidade com o nome de Zepbound.

  • TIRZEPATIDA

    • Agonista duplo do receptor GIP e GLP-1 que tem efeito sinérgico na glicose e controle de peso.
    • O Estudo SURMOUNT mostrou uma perda de peso de até 25% em um terço dos indivíduos sem DM2 em uso de tirzepatida.

Existem vários outros estudos com novas drogas para obesidade em andamento, o caminho é promissor para medicamentos triplo agonistas entre outras drogas com novos mecanismos de ação.

Referências

  1. Pi-Sunyer X, et al.A Randomized, Controlled Trial of 3.0 mg of Liraglutide in Weight Management. N Engl J Med 2015:373;11–22.
  2. Davies MJ, et al. Efficacy of Liraglutide for Weight Loss Among Patients With Type 2 DiabetesThe SCALE Diabetes Randomized Clinical Trial JAMA 2015;314:687–699.
  3. le Roux CW, et al. 3 years of liraglutide versus placebo for type 2 diabetes risk reduction and weight management in individuals with prediabetes: a randomised, double-blind trial. Lancet 2017;389:1399–1409.
  4. Blundell J, et al. Effects of once-weekly semaglutide on appetite, energy intake, control of eating, food preference and body weight in subjects with obesity. Diabetes Obes Metab 2017;19:1242–1251.
  5. Wilding JPH, et al. Once-Weekly Semaglutide in Adults with Overweight or Obesity. N Eng J Med. 2021;384:989–1002.
  6. Davies M, et al. Semaglutide 2,4 mg once a week in adults with overweight or obesity, and type 2 diabetes (STEP 2): a randomised, double-blind, double-dummy, placebo-controlled, phase 3 trial. Lancet. 2021;397:971–84.
  7. Wadden TA, et al. J. Effect of Subcutaneous Semaglutide vs Placebo as an Adjunct to Intensive Behavioral Therapy on Body Weight in Adults With Overweight or Obesity: The STEP 3 Randomized Clinical Trial AMA. 2021;325:1403–1413.
  8. Rubino D, et al. Effect of Continued Weekly Subcutaneous Semaglutide vs Placebo on Weight Loss Maintenance in Adults With Overweight or Obesity The STEP 4 Randomized Clinical Trial. JAMA. 2021;325:1414–1425.
  9. Marso SP, et al. Semaglutide and Cardiovascular Outcomes in Patients with Type 2 Diabetes. N Engl J Med 2017;376:891–892.
  10. Ryan DH, et al. Semaglutide Effects on Cardiovascular Outcomes in People With Overweight or Obesity (SELECT) rationale and design Am Heart J. 2020;229:61–69.
  11. le Roux CW, et al. Tirzepatide for the treatment of obesity: Rationale and design of the SURMOUNT clinical development program. Obesity. 2023;31:96-110.

Como citar este artigo

Silva ACC e Cohen RV. Novas medicações para obesidade Gastropedia 2024; vol 1. Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/cirurgia/obesidade/novas-medicacoes-para-obesidade/




Reganho de peso e perda de peso insuficiente após cirurgia bariátrica

A cirurgia bariátrica é o tratamento mais eficaz para a obesidade, uma doença crônica e progressiva. A perda ponderal após a cirurgia varia individualmente.

Desafios nas definições

Existe um conflito na literatura quanto à definição de perda de peso insuficiente e reganho de peso, pois a maioria dos relatos não diferencia essas duas condições.

  • Perda de peso insuficiente (PPI) pode ser definida como menos de 20% de perda de peso total após 2 anos de cirurgia, geralmente relacionada à recidiva de doenças associadas.
  • Reganho de peso (RP) é o ganho ponderal progressivo após atingir a perda de peso nadir bem-sucedida (> 20% de perda de peso total).

Alguns defendem que o RP só deve ser definido se houver recidiva concomitante de comorbidades. A falta de padronização nas definições significa que os dados sobre a prevalência de PPI e RP são desconhecidos.

Causas

As causas de PPI e RP são multifatoriais e estão resumidas na figura 1.

Figura 1 – Potenciais causas de reganho de peso e perda de peso insuficiente. RP= reganho de peso; PPI= perda de peso insuficiente

Estratégias de tratamento

  • Identificação de não-respondedores

Como todas as doenças crônicas, a obesidade tem diferentes respostas biológicas individuais ao tratamento. O alto grau de variabilidade na perda ponderal pode ser secundário a uma predisposição genética. Provavelmente num futuro próximo, marcadores vão auxiliar na definição da reposta a diversas opções de tratamento para a obesidade. Estudos mostram que pacientes com perda de peso menor que 500 g/semana entre 3 e 6 meses de pós-operatório provavelmente não chegarão a 20% de perda de peso total. Portadores de índice de massa corpórea acima de 50 kg/m2 também tem uma forma clínica de obesidade mais grave. Ambas as situações podem necessitar de tratamento farmacológico adjuvante precocemente no pós-operatório. 

  • Escolha da intervenção primária

Indicar o procedimento bariátrico mais adequado é crucial para melhores resultados. A escolha deve ser baseada na maior probabilidade de perda ponderal e melhor controle metabólico a longo prazo. Dada a heterogeneidade da população afetada e seu impacto individual, talvez nunca possamos identificar uma única operação que seja melhor para todos. As cirurgias mais realizadas mundialmente são a gastrectomia vertical (GV) e a derivação gastrojejunal em Y de Roux (DGJYR). A GV tem números mais altos de RP e PPI em estudos randomizados e controlados e séries de casos quando comparada com a DGJYR. A GV é frequentemente associada ao refluxo gastroesofágico levando a um número significativo de cirurgias revisionais. Uma seleção adequada e personalizada do paciente para o procedimento é obrigatória para os melhores resultados possíveis a longo prazo.

  • Intervenções dietéticas e comportamentais

São ainda pouco exploradas para prevenção do RP ou mitigação da PPI. Não há estudos que determinem a melhor estratégica dietética naqueles que apresentam reganho ou PPI. Poucos estudos mostram que o tratamento de comportamentos inadequados, como “beliscar “alimentos” podem influenciar os resultados, porém carecem de evidências científicas robustas. Assim como intervenções dietéticas e comportamentais, não há evidência de relação causal direta entre o impacto da atividade física nos resultados pós-operatórios relativos à perda de peso.

  • Farmacoterapia

A chegada das novas medicações (análogos do GLP1 ou estimuladores do duplo receptor GLP1/GIP) deve mudar o panorama de tratamento dos pacientes com PPI ou reganho de peso. A dúvida é o momento ideal da introdução da medicação. Será que deve ser rotineira em IMCs >50 kg/m2? Ou esperar o platô da perda ponderal? Ou ainda esperar o reganho de peso? São necessários estudos de nível elevado de evidência, porém é importante destacar  a eficácia destas medicações no tratamento clínico da obesidade e das doenças associadas, como o diabetes tipo 2, e como esses resultados devem ser semelhantes em pacientes operados.

  • Cirurgia revisional e intervenções endoscópicas

Se indicadas, os pacientes devem ser avaliados pela equipe multidisciplinar e estudos radiológicos e endoscópicos para estudo da anatomia e diagnóstico de eventuais complicações corrigíveis, como as raras fístulas gastro-gástricas.

Cirurgia revisional e opções endoscópicas após GV e DGJYR

O reganho de peso ou perda de peso insuficiente são mais comuns após a GV do que após DGJYR.

Múltiplas alternativas cirúrgicas para revisar uma GV foram propostas. 

  • Refazer a GV ou realizar uma plicatura da mesma não tem resultados significantes. 
  • Embora ainda sem resultados a longo prazo, há mais dados mostrando a maior eficácia da conversão de GV em DGJYR. 
  • Não há dados suficientes sobre a conversão de GV para novas técnicas propostas, como o bypass de uma anastomose (OAGB) ou a duodenoileostomia de anastomose única (SADI-S)
  • Conversões de RYGB em outras operações são anedóticas. Com a nova farmacoterapia, a cirurgia revisional por PPI/RP tende a ter seu número reduzido

Dentre as opções endoscópicas, há propostas de sutura para diminuir o diâmetro da anastomose gastrojejunal após DGJYR ou plicatura endoscópica de uma GV. Os resultados são modestos e ainda com acompanhamento de curto prazo.

Figura 2 – Estratégias de tratamento para perda de peso insuficiente/Reganho de peso após cirurgia bariátrica. PPI = perda de peso insuficiente; IMC = índice de massa corpórea

Referências

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Como citar este artigo

Cohen RV e Petry TBZ. Reganho de peso e perda de peso insuficiente após cirurgia bariátrica. Gastropedia 2023, Vol 1. Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/cirurgia/obesidade/reganho-de-peso-e-perda-de-peso-insuficiente-apos-cirurgia-bariatrica