Cirurgia cooperativa laparoscópica e endoscópica (LECS) para ressecção de GIST gástrico

Autores: Henrique Lopardi Passos, Annita Cavalcante Farias Leoncio Cardoso, Eduardo Rullo Maranhão Dias, Pedro Henrique de Freitas Amaral, Sergio Roll, Bruno da Costa Martins

Introdução

A gastrectomia parcial laparoscópica para tumores gástricos submucosos é um procedimento simples, seguro e bem difundido. Entretanto, a visão somente laparoscópica, da superfície serosa, pode tornar difícil a localização de tumores no lúmen gástrico, resultando em uma ressecção extensa da parede gástrica que, por sua vez, pode levar a deformidades e obstrução do trânsito do órgão. Também há vários relatos de margens de ressecção positivas e recorrência local pós-operatória devido ao desconhecimento do local preciso da lesão.

Para resolver estes problemas, surgiu em 2006 a cirurgia cooperativa laparoscópica e endoscópica (laparoscopic and endoscopic cooperative surgery – LECS), a qual vem evoluindo e se difundindo cada vez mais. O conceito está começando a ser aplicado também para excisões tumorais em outros órgãos, como duodeno, cólon e reto, com expectativa de ainda mais evolução no futuro. Para saber mais sobre esta técnica, confira este outro artigo do GASTROPEDIA: https://gastropedia.pub/pt/cirurgia/esofago-estomago-duodeno/tecnicas-combinadas-para-resseccao-localizada-de-espessura-total-da-parede-do-trato-gastrointestinal-laparoscopic-and-endoscopic-cooperative-surgery-lecs/.

Caso Clínico

Vídeo apresentando ressecção videolaparoscópica de GIST gástrico em parede posterior de corpo alto, próximo à cárdia, com o auxílio da endoscopia digestiva alta. A lesão media 26,5 x 19,1 mm, tendo diagnóstico através de punção ecoendoscópica, confirmado por imuno-histoquímica, sem metástases ao exame tomográfico. Devido ao tamanho da lesão e por se tratar de um tumor de baixo grau, foi indicada ressecção local por via laparoscópica. No procedimento, por se tratar de um tumor de difícil localização para ressecção local, em corpo alto, próximo à cárdia, em parede posterior, foi solicitado auxílio da endoscopia digestiva alta no intraoperatório, realizando um procedimento combinado (LECS).

A equipe de endoscopia realizou injeção de Voluven com azul de metileno para elevação da submucosa, permitindo a dissecção do tumor pela equipe de cirurgia e ressecção total da lesão por via videolaparoscópica e possibilitando uma menor área de grampeamento, com mínima deformidade do órgão. Não houve abertura da mucosa ou sangramento durante o procedimento. O tempo cirúrgico foi de 70 minutos. Três dias após a cirurgia, a paciente recebeu alta hospitalar, sem dor e aceitando bem dieta líquida.

No laudo anatomopatológico, foi confirmado o diagnóstico de tumor estromal de baixo grau, medindo 4,1 cm no maior eixo, com 1 mitose por 5 mm2, margens livres, sem invasão angiolinfática e pT2. Paciente se encontra em seguimento ambulatorial, assintomática.

Tumor Estromal Gastrointestinal (GIST)

Este tumor é uma rara neoplasia mesenquimal do trato gastrointestinal (TGI), apresentando-se tipicamente como uma lesão subepitelial do estômago e do intestino delgado. A maior parte destes tumores apresenta mutações características nos genes KIT ou PDGFRA, representando 1 a 2 % dos tumores primários do TGI, além de serem os tumores mesenquimais mais comumente encontrados nesta localização.

Muitas vezes os GISTs são detectados acidentalmente em pacientes assintomáticos por exames endoscópicos ou de imagem, mas algumas vezes os pacientes apresentam sinais e sintomas, como sangramento, disfagia, icterícia obstrutiva, constipação ou obstrução intestinal. O diagnóstico é estabelecido por histopatologia, imunohistoquímica e identificação de mutações específicas.

O diagnóstico diferencial inclui tumores subepiteliais benignos e malignos, muitos deles similares aos GISTs.

Como tratamento para os GISTs não metastáticos, temos a ressecção cirúrgica como padrão-ouro, com o objetivo de atingir uma ressecção R0.

Referências

  1. Hiki N, Nunobe S. Laparoscopic endoscopic cooperative surgery (LECS) for the gastrointestinal tract: Updated indications. Ann Gastroenterol Surg. 2019;3:239–246. https://doi.org/10.1002/ags3.12238
  2. Chandrajit P Raut et al. Clinical presentation, diagnosis, and prognosis of gastrointestinal stromal tumors. Uptodate 2023. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/clinical-presentation-diagnosis-and-prognosis-of-gastrointestinal-stromal-tumors.

Como citar este artigo

Passos HL, Cardoso AC, Dias ER, Amaral PH, Roll S, Martins BC, Cirurgia cooperativa laparoscópica e endoscópica (LECS) para ressecção de GIST gástrico Gastropedia 2024, vol 1. Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/cirurgia/cirurgia-cooperativa-laparoscopica-e-endoscopica-lecs-para-resseccao-de-gist-gastrico




Neoplasia Pseudopapilar Sólida do Pâncreas (Tumor de Frantz)

A Neoplasia Pseudopapilar Sólida do Pâncreas (NPSP), conhecida previamente como Tumor de Frantz, é um tumor geralmente benigno, porém com potencial de malignidade. Estas lesões são raras, representando menos de 2% das neoplasias pancreáticas. Predominam em mulheres jovens (20-30 anos), sendo geralmente assintomáticas. Quando há sintomas, o principal deles é a dor abdominal. Geralmente são encontrados de forma incidental em exames de imagem como tomografia computadorizada e ressonância magnética. Nesse artigo, vamos resumir as principais características desta neoplasia.

Apresentação Clínica:

No passado, a maioria dos casos desta neoplasia eram sintomáticos (80%). No entanto, com a utilização disseminada dos métodos de imagem, houve grande aumento dos achados incidentais em pacientes assintomáticos, que atualmente representam cerca de 50% dos casos. O sintoma mais comum é dor abdominal, seguido de náuseas, vômitos e perda de peso. Outros sintomas menos frequentes incluem icterícia e pancreatite. Alguns pacientes podem apresentar massa palpável, visto que a lesão não costuma causar sintomas nos estágios iniciais.

  • Representam menos de 2% das neoplasias pancreáticas.
  • Predominantes em mulheres jovens (20-30 anos).
  • Geralmente são assintomáticos.
  • Principal sintoma: dor abdominal.
  • Diagnósticos incidentais em TC, RM e US.

Características nos exames de imagem:

  • As NPSP podem aparecer como uma lesão pancreática mista, sólida e cística, em imagens de TC e RNM.
  • Também podem aparecer como tumores sólidos bem demarcados.
  • Num estudo das características de RM de pequenos tumores sólidos do pâncreas, os NPSP apresentavam uma intensidade de sinal significativamente mais baixa nas imagens ponderadas em T1, uma intensidade de sinal mais elevada nas imagens ponderadas em T2 e um realce heterogêneo e progressivo precoce na RM, em comparação com os adenocarcinomas e os tumores neuroendócrinos.

Características Endoscópicas (EUS):

  • Lesões geralmente são bem demarcadas (aspecto encapsulado), hipoecogênicas e de aparência sólida.
  • Podem ter áreas císticas de permeio, proporcionando uma imagem heterogênea, ou ser predominantemente císticas.
  • Podem ser encontradas em qualquer lugar do pâncreas: cabeça, corpo, cauda e processo uncinado.
  • Calcificações podem estar presentes em até 20% dos casos.
  • Outra característica que pode ser encontrada é a presença de vasos no interior do tumor, que podem ser visíveis como pequenas estruturas hiperecogênicas que atravessam a lesão.

Diagnóstico por EUS-FNA:

  • O fluido aspirado do cisto é tipicamente sanguinolento.
  • Sensibilidade: 80-90%, Especificidade: 85-96%.
  • Fornece informações morfológicas para planejamento cirúrgico.

Características Histológicas e Marcadores Moleculares:

  • A citologia é diagnóstica em 75% dos casos.
  • Apresentam estrutura complexa de células poligonais.
  • A disposição das células tumorais ao redor dos vasos capilares confere à lesão uma aparência “pseudopapilar” irregular.
  • A análise citológica revela papilas ramificadas características com estroma mixoide.
  • A análise imuno-histoquímica, incluindo vimentina, CD10 e beta-catenina, auxilia a diferenciação entre uma NPSP e um tumor neuroendócrino pancreático.

Características Sugestivas de Malignidade:

  • Tamanho > 5 cm.
  • Mitoses frequentes.
  • Índice Ki-67 elevado (> 5%).
  • Invasão vascular ou linfática.
  • Presença de necrose.
  • Presença de metástases à distância.

Tratamento e Prognóstico:

  • Ressecção cirúrgica completa é a abordagem definitiva, devido ao potencial de malignização.
  • Escolha cirúrgica é baseada na localização (duodenopancreatectomia ou pancreatectomia distal).
  • Sobrevida pós-operatória próxima de 95%, com necessidade de monitoramento.
  • Acompanhamento a longo prazo é essencial para identificar recorrências.

Referências:

  1. Arief Suriawinata.Pathology of exocrine pancreatic neoplasms. Uptodate 2023. Disponivel em: https://www.uptodate.com/contents/pathology-of-exocrine-pancreatic-neoplasms.
  2. Asif Khalid, Kevin McGrath. Pancreatic cystic neoplasms: Clinical manifestations, diagnosis, and management. Uptodate 2022. Disponivel em: https://www.uptodate.com/contents/pancreatic-cystic-neoplasms-clinical-manifestations-diagnosis-and-management.
  3. Okasha, H., Abbas, W., Altonbary, A. et al. Role of endoscopic ultrasonography in the diagnosis of solid pseudo-papillary neoplasm: Egyptian multi-centric case series and systematic review. Egypt J Intern Med 34, 9 (2022). https://doi.org/10.1186/s43162-022-00105-z

Como citar este artigo

Passos HL, Souza CS, Martins BC. Neoplasia Pseudopapilar Sólida do Pâncreas (Tumor de Frantz). Gastropedia 2024 Vol. 1 Disponível em: https://gastropedia.pub/pt/cirurgia/hepatopancreatobiliar/neoplasia-pseudopapilar-solida-do-pancreas-tumor-de-frantz